sexta-feira, 18 de junho de 2010

Nada mais anacrônico que desejar que o passado continue servindo de orientação para tentar organizar o presente. Falo isso porque às vezes sinto falta de contestadores que usem o romantismo como aríete para derrubar acomodações do pensamento. Falo de contestadores mesmo, como os que fizeram parte de uma geração de Quixotes esguios e inflamados como Saramago. Depois caio em mim e reconheço que os tempos hoje são outros, assim como os desejos.
Quando um Saramago mais jovem zanzava pelas ruas de Paris, o Ocidente era tão hermético em seus equívocos autoritários que dividia o pensamento em duas partes tão inconciliáveis que somente uma pena ferina como a dele e a de outros amigos da “Confraria de Paris”, é que seria capaz de despertar corações jovens para a urgência de uma revolução de ideias que contrariasse certezas impostas. Saramago defendeu a liberdade de pensamento com tanta veemência que quando achou necessário atacar a Igreja Católica e mais tarde romper com um dos amigos mais próximos, fez sem titubear. Nisto, ele atuou brilhantemente como um sacerdote até que de repente, num susto, o mundo mudou inesperadamente, contrariando tudo o que era esperado pela geração dele. Pouco tempo depois (1995) ele escreve “Ensaio sobre a Cegueira”, talvez, uma fábula profética sobre a rendição passiva do Ocidente ao neoliberalismo, ao individualismo e à superficialidade feroz dos tempos que estamos vivendo hoje.
Hoje morreu Saramago (1922-2010).
Que tem no nome, dois dos caminhos que não pude.
Foto: Tuca Vieira / Folhapress

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Adoro você comigo. Adoro sua pica, seu beijo de língua, seu papo, mas isso não é o bastante. Adoro seu riso, seu cheiro, suas mãos, mas isso não é o bastante. Adoro quando me faz rir, mas isso não é o bastante. Adoro dormir abraçada contigo, mas isso não é o bastante. Adoro viajar pra ver coisas ao seu lado, mas isso não é o bastante. Adoro dividir com você a minha alegria, mas isso não é o bastante. Adoro quando tiras o horror da minha face, mas isso não é o bastante. Adoro acordar de bem e te dar, enlouquecer de quatro,  te chupar até engasgar, me permitir ser invadida pelo seu corpo intenso, mas isso não é o bastante. Adoro quando lê pra mim nas noites que estou sem sono, mas isso não é o bastante. Adoro ser seu poema, sua menina espevitada, sua deusa, seu auto, sua farsa, mas isso não é o bastante. Adoro quando troca meus curativos, mas isso não é o bastante. Adoro saber que estás sempre por perto, mas isso não é o bastante. Te amo pra caralho! É forte, é muito, é tudo... é realmente uma pena que até isso... também não é o bastante.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Um aspirante a Ghost se tiver certa manha, não teria dificuldade alguma para em poucas linhas, fazer uma superação de mazelas parecer fácil como transformar o azedume particular de um borderliner numa caipirinha comunitária. Os ingredientes são fáceis de achar; meia dúzia de frases feitas, analogias, metáforas, hipérboles e quando fosse conveniente, uma pitada de eufemismo. Para fechar em tom messiânico; paráfrases, falácias e afirmações categóricas sobre a vida ser isso ou aquilo. Para algo pseudoquântico, meta o universo no meio e diga por exemplo que ele tem uma teoria da conspiração a favor de todos nós, que sentando à beira do Ganges, o pensamento está destinado a cruzar o Himalaia.
Caso precise de um tutorial, digite no Google; Castañeda, Coelho, Rampa. Exceto o Coelho, dos outros dois, quase ninguém se lembra. Se quiser algo supremo, beba de tudo que estiver minando de Buda, Cristo ou Maomé, mas se for rolar um zen-pop, plagie Chopra, distorça Osho, recicle Harrison. O editor quer lombada grossa? Seja prolixo, nesse caso, cantarole Veloso, discurse Gil, assovie Lulu e jamais tente ir sozinho atrás de algum Buarque, é mais difícil do que parece. Vai construir e depois derrubar? Rita e Raul. Necessita de sustentação acadêmica? Rosne Foucault, receite Jung, psicografe Lacan. Se for grana; Lair Ribeiro. Genialidade; use o Machado. Para descer como Jó ao profundo; mergulhe em Lispector e depois saia na terceira margem do Rosa. Figuras notáveis, pouco citadas? Pegue Gandhi, Mandela. Agora cuidado! Passe longe de poesia. Não se meta com poetas. Para falar a verdade, poesia não serve como autoajuda. É mais fácil um heterônimo te convencer a pular no Tejo que se ajoelhar em Fátima. Bulir com poesia é perigoso e costuma até piorar o problema, pois poeta que é poeta, é isso aí que todo mundo sabe _ só serve mesmo para virar gauche na vida.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Há na morte inúmeras vantagens quando comparada ao estar amando, talvez a principal delas seja a total ausência de expectativas em relação à você próprio e ao ser enamorado, afinal, onde não há um conjunto de metas inalcançáveis a serem alcançadas, não há frustração, uma vez que na morte, a igualdade de condições anula a necessidade de encenações, de promessas, dos jogos sociais de interesses tais como os que se costuma esconder na primeira fase dos encontros. Contudo, o melhor de estar morto em relação a estar amando é não mais ter a obrigação de se submeter a cansativa tarefa de inventar as mentiras de manutenção, tão essenciais para os que estão unidos numa pantomima romântica. Sem tais mentiras, as pernas finas do amor se quebram com facilidade, fazendo-o cair ruidosamente, pois para se viver em paz com o amado é preciso antes de tudo, mentir. Mentir para entrar num relacionamento, mentir para permanecer nele e ironicamente, apenas para sair é que as verdades são cruelmente descobertas e postas à vista.
Há também outro aspecto não menos importante, onde o estar morto oferece mais uma grande vantagem em relação ao estar amando; a oportunidade única de experimentar a absoluta ausência de medo, porque quem está amando se alimenta exclusivamente de medo. Há o medo de perder o que se acredita ter a posse, perder o que se pensa estar sendo compartilhado em partes iguais. Por isso a obsessão dos amantes em proteger o tempo todo os amados. Some a isso, como característica dos que esperam ser supridos pelo amor, o medo da solidão que assola a todos desde o berço, o medo da separação, o medo de parar de receber a dose diária do ópio que sustenta a segurança falha e a falsa cumplicidade desse tipo de encontro. Finalmente, o que sobra entre tais medrosos, é o medo ter o objeto do desejo roubado por um outro, que se mostre melhor e mais desejável. Isso é o que faz crescer consideravelmente dentro do corpo hospedeiro, a dúvida que seca de medo o fígado dos ciumentos. No entanto, ao estar morto, paira sobre essa inexistência, o sossego de certezas que não podem mais ser removidas. Estar morto é, em fim, o fim de todos os medos, o desfrutar de um estado de graça que somente quando comparado a maldição do amor é que se passa a compreender plenamente que a danação eterna é feita do mesmo tecido vivo do estar amando.

"Se não me engano, infelizmente ainda restam mais quatro"

domingo, 13 de junho de 2010

Fui menino numa época que o erotismo editorial para as massas no Brasil, era Carlos Zéfiro, cara que o traço hoje é considerado cult e está na capa do Barulhinho Bom da Marisa Monte. Era um período de repressão sexual tão forte, que se a polícia flagrasse um jornaleiro vendendo os "catecismos", como eram chamadas as revistinhas de sexo explicito do Zéfiro, o coitado ia até preso como contraventor. O próprio zéfiro produzia toda aquela maravilhosa obra de arte na clandestinidade, vendendo o material para editores espertalhões por uma mixaria e morreu na miséria por conta disso. Quando acabou a censura moralista e revistas como Lui, Ele & Ela, mais tarde a revista Homem (que virou depois a Playboy brasileira) começaram a publicar mulheres nuas de pernas abertas (o regime militar proibia fotos de nudez com modelos de pernas abertas), a garotada de palma da mão peluda, foi literalmente ao delírio.
Com a chegada da internet, a nudez e o sexo assumiram proporções jamais vistas no tempo em que as pin-ups de off-set eram escondidas estrategicamente debaixo do colchão. Hoje em dia, conta-se com tamanha variedade e especificação que a demanda precisou ser catalogada e subdivida por categoria. A internet também ajudou a derrubar a falácia de que sacanagem é uma coisa e erotismo é outra, que uma é mais aceitável do que a outra ou ainda, que uma é arte e a outra é lixo. O corpo de adultos sem roupas seja pela lente do premiado J.R. Duran ou por uma lente anônima, serve apenas a um mesmo propósito, ao estímulo com fins onânicos e ponto final. Discutir isso apenas redunda a bunda, pois tentar moralizar ou desmoralizar o exibicionismo voluntário de adultos que são muitas vezes, bem pagos para fazerem isso, não só é inútil como dependendo do púlpito, hipócrita.
Discussões a parte, percebo que meu olhar tem estado menos inclinado ao voyeurismo nos últimos anos. Talvez o excesso de material disponível, esteja me causando certo enfado, devido a uma espécie de "samba de uma nota só" que é essa repetição sem variações do mesmo tema. Reconheço que certos trabalhos são sofisticadíssimos com o do Vlad Gansovsky ou para quem como eu, não curte muito "divas" e prefere particularmente o estilo sexy-ugly de gente comum, pessoas imperfeitas em estrias, pintas, papada, gorduras, manchas, cicatrizes, espinhas, celulite, tudo isso sem um pingo dessa babaquice irritante chamada Photoshop, há inúmeros sites especializados. É possível também que a causa do meu atual estágio seja a frustrante extinção do meu desejado projeto tântrico (tantra é mais que apenas sexo) e com isso, seja em pixels ou em epiderme, tenho insistido em ver nas raparigas do além-mar, menos mesa para banquete e mais leito sob lençóis de linho. Um lugar que quando chego do cansaço de viver (e acreditem; estou mesmo cansado disso), deito, me cubro e durmo, desejando muito mais um longo sono tranquilo com direito a sonho bom, que um obrigatório, brevíssimo e com o tempo, entediante orgasmo.