A carteirinha de estudante toscamente falsificada aumentou minha idade para dezoito anos. Foi assim que conseguir entrar no cinema com alguns amigos para assistir ao Laranja Mecânica (1971), do genial Stanley Kubrick (1928-1999), quando finalmente liberado pela censura, em 1981 com cortes e outras restrições para o público. A história de adolescentes viciados num tipo de leite lisérgico e que reunidos em gangs uniformizadas aterrorizavam uma apática Londres do futuro, falida econômica e socialmente, ficou na geladeira da ditadura militar por dez anos por conter as famosas cenas de nú frontal feminino, jamais vistas até então em telas brasileiras. Também continha o que foi chamado de ultraviolência, envolvendo racismo, tortura, estupro, espancamento, assassinatos e uma cena com uma imagem religiosa que incomodou bastante a Igreja Católica.
O irônico nisso é que a ultraviolência a que tanto se temia que os jovens da época ficassem expostos, hoje em dia, faz parte da realidade diária de meninos e meninas do Brasil, no caso de uns, nas comunidades onde moram ou estudam, no de outros nos fóruns, blogs e inúmeros outros locais de compartilhamento de vídeos e games pela internet.