E estava ele do outro lado da rua. Cabelos ficando visivelmente grisalhos, camiseta branca, bermuda e sandálias. Ao me ver, atravessou e veio falar comigo. Atualizamos nossos e-mails, falamos de alguns sumidos, perguntamos sobre filhos, as quantas andavam as relações com nossos pares, etc. Mesmo que não estivéssemos com pressa, o encontro não tinha mesmo a intenção de ser mais longo do que foi. O brevíssimo espaço de tempo entre um sinal que fecha e abre, foi suficiente para folhear tudo o que era preciso saber. Confesso que já esqueci uma boa parte do que foi dito, exceto a parte que ele disse que agora em abril, fará cinquenta anos e que estava tranquilo, cheio de planos, mas que desta vez, estes não vinham mais com as ansiedades do desejo de querer saber a todo custo, se o que vem pela frente é o caminho certo ou o errado. Notei pelo sorriso que havia mesmo uma verdade naquele olhar distante de ilusões perdidas. Ali na esquina com um sol da tarde na cara, falou orgulhoso sobre as duas filhas já criadas, espalhando as palavras numa irresistível calmaria, como se cinqüenta não representasse o começo de uma jornada em direção ao crepúsculo, mas sim uma provável trégua com o tempo, essa divindade que em completo silêncio em seu canto, permite a quase todos que gozem, dentro do possível, do estar vivo em cada fase da vida, mas sem direito a repetir. Talvez para que se entenda logo, que não importa quem somos, nem a quantidade de projetos, de coisas feitas ou do que deixamos de fazer, um dia de cada vez é tudo e quem sabe, a única coisa que de fato temos.