quinta-feira, 5 de novembro de 2009


“O pior dos problemas da gente é que ninguém tem nada com isso”. A madrugada já estava começando a envelhecer e minha jovem sobrinha insone me falava pelo skype que entre tantas que adorou, sentia nesta algo meio mau-humorado. Achamos engraçado e depois comentei que assim na seca, até parecia mesmo, mas que lendo um pouco mais, sobretudo no contexto, talvez a reflexão fosse mais pelo lado do humor "ácido-cínico" que ele costumava salpicar por cima das coisas ditas sérias. Quintana, assim como Drummond, era agnóstico confesso e talvez por isso, inteligentemente cáustico ao sacanear alguns valores cristãos como o apiedar-se diante de pequenos infortúnios.
Quanto a ser ele solitário e viver distanciado do afeto dos amigos por conta de um constante estado ruim de humor, sinceramente não creio, em vista do testemunho que esses mesmos amigos deixaram registrado. É fato que Quintana, era sim solteiro sem filhos e que morou sozinho por anos a fio num quarto de um luxuoso hotel em Porto Alegre. O dono gostava tanto dele, que lhe cedeu o cômodo por tempo indeterminado, sem cobrar um tostão pela diária e com refeições incluídas. Diferente do que acontecia com o Drummond ou o Vinicius, que eram aposentados do serviço público e muito bem remunerados, Quintana contava com a vaquinha dos amigos para estar sempre com alguma graninha no bolso. Depois que o velho Hotel Majestic encerrou as atividades para virar a rosada Casa de Cultura Mario Quintana, outra moradia teve de ser providenciada. Foi então que Paulo Roberto Falcão, ex-jogador da seleção brasileira, ídolo do “Inter” de Porto Alegre, amigo, admirador, além de proprietário do Hotel Royal, cedeu a Quintana um novo quarto. Novamente o poeta que morava sozinho, mas não era solitário, vivia num hotel com direito a refeições e sem precisar pagar diária. Assim, ele que certamente tinha muitos problemas, também teve alguns deles resolvidos com uma ajudazinha de alguns amigos.
"Yes, I get by with a little help from my friends" [ Lennon & McCartney ]

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Eu já vinha pensando muito depois de um tempo de experiências e acho que foi nesse ponto que surgiu a necessidade de rever quase tudo que me servia de lastro. O que vinha dirigindo minha vida até então era um velho excesso de certezas. Havia nela muita opinião formada. Acho que um dos problemas do excesso de certezas é que você começa a acreditar na existência de numa visão central para enxergar tudo, algo absoluto que determina o que é ou não realidade, e pior ainda, costuma-se levar muito a sério as próprias opiniões. Paralelamente a isso, iludir-se achando que de alguma maneira, isso poderia servir pra todo mundo, como se algumas opiniões pudessem mesmo darem-se ao luxo de continuarem imutáveis a vida inteira. Atualmente me esforço bastante para ser bem mais cuidadoso em expressar minhas "convicções" e bem mais flexível em avaliar a dos outros, mesmo quando sinto que não tenho muito o que compartilhar delas. No meu caso confesso; é um exercício bem difícil, pois há tempos atrás, fiz do proselitismo uma bandeira e simplesmente metralhava sem dó tudo aquilo que precipitadamente considerava inadequado à minha visão de mundo. Pessoalmente, acho esse o segundo problema do “excesso de certezas”. Em algumas situações, agarrar-se inflexivelmente a uma certeza costuma ser o trampolim para a prática de todo tipo de “fundamentalismo” seja em questões de gênero, política, economia, estética, etnia, religião e outros. É bem possível que quase todo linchamento comece com um excesso de certezas. Num plano mais leve, corre-se risco, se não tomar cuidado, de virar um puta chato que não só acredita que precisa doutrinar aqueles que não pensam como você, como patrulhar as escolhas de vida dos outros. Quando saquei que estava bem próximo disso, decidi não convidar mais ninguém para sentar comigo debaixo duma árvore e esperar por Godot. Desde então tenho apenas tentando seguir bem mais leve o meu curso. Em vez duma queda-livre, flutuar nas ascendentes como faz qualquer mutante.

terça-feira, 3 de novembro de 2009


Olha-me, oh, yes! oh, yes! Brasileira mente linda, oh, yes! oh, yes! Linda mente brasileira. Mente brasileira, lindamente brasileira. Envolve-me, oh, yes! oh, yes! Brasileiramente linda, oh, yes! oh, yes! Lindamente brasileira. Eu não vou querer o amor somente... é tão banal. Busco a paixão fundamental, edípica e vulgar de inventar meu próprio ser. Oh! senhora dona cândida coberta de ouro e prata... descubra seu corpo-rosto, nós queremos ver-lhe a alma antes que algum rouxinol diga que é dia, é de manhã, o sol já vem: here comes the sun! Vem, estrela camponesa, Vênus, nuvem nua, lua nova, anjo fêmea. Beija-me, oh, yes! oh, yes! Como se eu fosse um homem livre, oh, yes! oh, yes! Como um gesto primitivo, oh, yes! oh, yes! Do amor humano, animal, substantivo... Do amor humano, moreno, brasileiro. No Brasil e no estrangeiro! O maior amor do ano no cinema americano. [ Belchior ]