Monica Imbuzeiro / O Globo |
Quando eu era comunista xiita, o termo “patrulha ideológica” servia para identificar os que tomavam conta da vida alheia, para detectar pequenos indicativos que revelassem algum pensamento divergente da “doutrina”. Era um tempo em que para se autoafirmar, se mostrar politizado e culturalmente desenvolvido, o sujeito precisava confessar uma série de coisas que adorava e outras que detestava, meio parecido hoje com os clássicos “amo isso” ou “odeio aquilo” no Orkut.
Naquela época, para ser descolado, era preciso ler regularmente O Pasquim, citar Gil e Caetano como base para algumas questões filosóficas ou conseguir “traduzir” as letras criptografadas que Chico e Vandré escreviam para burlar a censura. Falar mal do Cinema Novo era outro pecado. Sugerir que os filmes do Glauber eram chatos e complicados demais, nem pensar. O tempo passou, o muro caiu e a cruzada intelectual da esquerda perdeu força no apito, mas as “patrulhas” sobreviveram, basta dar uma geral nos Facebooks e Twitters da vida para ver que ainda continuam ativas de coturno no pé e cacetete na mão.
Daí chega alguém e diz_ mas e a liberdade de expressão? Ao publicar opiniões, o que eu entendo por liberdade de expressão é se esforçar para conseguir comunicar no mínimo de um jeito relativista, as razões de se preferir uma coisa e não outra, defender um jeito particular de pensar, evitando o proselitismo ou tentar impedir outros de criticar ideias. Nem sempre isso é fácil eu sei, mas ainda assim, acredito que qualquer tipo de fundamentalismo, seja religioso, cultural, estético ou político, só sirva mesmo para promover linchamentos e alimentar o sectarismo.
5 comentários:
de acordo.
Não vivi a época da "patrulha ideológica". Acho que teria sido bom, pois o que ficou, o que somos hoje é uma ambígua postura ideológica: aqueles que acham que podem dizer tudo ("sou autêntico, falo a verdade na cara") doa a quem doer, como se isso fosse uma virtude; e aqueles que se calam acreditando que estão respeitando opiniões e a liberdade de expressão. Se não podemos patrulhar a vida alheia, também não podemos viver de silêncios. Será o relativismo o caminho do meio budista?
Grande abraço
Carol
Caminho do meio? Hahahahaha, essa foi muito boa Carol..., mas certamente que não.
As “patrulhas ideológicas” eram arrogantes, intolerantes e agressivas! Pareciam até a Gestapo policiando e reprovando as escolhas dos outros. Hoje em dia, isso costuma ser chamado de fundamentalismo, que é quando um grupo político, religioso, cultural, etc, tenta impor na marra suas “verdades” usando as mídias, mas principalmente os sites de relacionamento para atacar os que não pensam exatamente como eles, em alguns casos, tentando desmoralizar seus críticos, buscando converter mentes em conflito e corações incautos.
Já o que chamei de “opinião relativista” nada tem a ver com se calar ou ficar no meio, em cima do muro, mas significa não adotar o mesmo tom discriminatório ao usar texto ou voz para se posicionar contra aqueles que querem no grito, monopolizar ideias fascistas para disseminar o inferno que é a privação das liberdades.
Bjs.
Ótimo esclarecimento, Gil. Muito bom! Mas eu sou tão preocupada em não ferir ideologicamente ninguém (mesmo que no íntimo tenha minhas convicções) que, publicamente, procuro sentar em minha posição de monge e meditar. Não é tão ruim. Pois quando damos nossa a cara a tapa, sempre vem alguém para estapear. Talvez seja mais auto-preservação do que respeito... rsrs
Bj
Acho justo Carol! Eu tbm vivo sem banda ou bandeira. Decidir se orientar pelas próprias percepções pode ser uma boa medida. :)
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