sexta-feira, 9 de outubro de 2009




PEQUENO ENSAIO SOBRE O TEMPO,
O TÉDIO E O ÓCIO

Para todas as criaturas que vivem e morrem debaixo do sol, todos os dias são domingo e todas as horas são; agora, menos para nós, que somos homo e sapiens. A natureza tem lá os seus ciclos, mas hoje os achamos uma chatice, a prova disso é que depois de passarmos algumas eras sob o ritmo moroso da natureza, ficamos de saco tão cheio que demos até um nome para tudo isso; tédio.
Parece que foi depois de começarmos a olhar para o céu e a ter consciência da passagem do tempo, que começou nossa piração de querer contá-lo do nosso próprio jeito. Para garantir que dias e noites “parassem” de passar com a vagarosidade costumeira deles, dividimos os dois únicos períodos que conhecíamos até então, o claro e o escuro, em pequenos fragmentos numerados. Pode ser que seja baseado nesses números que cada povo inventou uma definição do que é ganhar ou perder tempo! Talvez a idéia no começo fosse ficar livre do ócio, que é ter pouco ou nada para fazer, e do tédio, que é estar completamente convencido que o tempo não passa.
Para complicar, começamos catalogar e dar nomes para a percepção dos efeitos que a passagem desses ciclos costumam causar em nosso corpo e na imagem que isso parece aos outros. Para tentar escapar daquilo que chamamos pasmaceira, inventamos uma rotina de quefazeres que repetimos metódica e diariamente como indispensáveis a vida. Mas e os quepensares? Quepensares não, pois além de só servirem para mandar Nietzsche pro hospício, não são muito eficazes contra a falta de quefazeres.
Contar o tempo serve também para nos manter presos tanto às lembranças do que passou, quanto à expectativa do porvir. Essa obsessão em estar atracado ao o passado e querer inutilmente saber como será o futuro, não nos deixa perceber que viver mesmo só é possível no agora, e um segundo de cada vez, equilibrando-nos sobre um fio de incontroláveis incertezas. É uma dança solitária e cega na ponta de sapatilha sobre a lâmina afiada do acaso.
Já os bichos, que segundo a nossa visão antropocêntrica, não são nem homo e nem sapiens, lidam com o tempo sem dar a mínima para agendas, compromissos, minutos, cronogramas, atrasos. Viver essa vidinha simplista é muito pouco para nós! Precisamos de complicação! Talvez tenha sido por isso que não aguentamos ficar muito tempo na boa como bonobos, trepando o dia todo, espreguiçando, catando piolhos e carrapatos nos pelos uns dos outros. Isso era ócio demais para aquilo que no futuro a gente iria fazer
Então é isso, entre um verão e um inverno há semeadura, há colheita, guerras étnicas, menstruação, fases da lua, casamentos, imolação de virgens para garantir fartura. Somos a formiga e a cigarra que Deus ajuda sempre que uma delas decide madrugar, mas também somos mão-de-obra barata, somos holerite, mais-valia, Karl Marx, Wall Street, escravidão, Henry Ford, Visa, vinte e oito dias, Nasdaq, o aluguel do apartamento atrasado e por último, somos pura culpa quando nos sentirmos ocasionalmente entediado ou pior; ociosos. Os almanaques, afirmam que a preguiça é um dos Sete Pecados Capitais, e que é Deus quem leva o credito pela invenção do trabalho, ao passo que para fins de causa e efeito, fica em qualquer cabeça vazia, o endereço da oficina do Diabo! O resto veio no vácuo e nem mesmo depois que aquele italiano teorizou sobre um tal; “ócio criativo”, a gente sossega! Por falar nisso, esse mês tem feriadão, que é quando todo mundo combina de desfrutar o ócio sem culpa, mas aviso; uma vez no ócio, sobra o tédio e como para ele não há remédio, resta-nos secretamente torcer para que o feriado passe logo para voltarmos à velocidade das coisas que já estamos viciados.


“Ticking away the moments that make up a dull day”

3 comentários:

Camilla Dias Domingues disse...

Eu não sei ainda se dou sapiens mas homo eu sei que sou! rs!
Esses dias estava com uma saudade tão intensa do passado, do "tempo que passou", das coisas que vivi: pessoas, lugares por que passei e tals que chorei e não foi qq choro, foi um choro sentido, sentido por aquilo que não voltará nunca mais... doeu lá no fundo chega a ficar apertadinho! enfim... melhor deixar pra lá! rs!
Quanto a questão dos bichos pode ser explicado por Marx, puro instinto de sobrevivência, as vezes eu queria! kkkk...

GIL ROSZA disse...

ô menina. a nostalgia é foda. eu tb nao sei lidar com ela. to procurando um jeito de descobrir =).

Thaissa Costa disse...

Por isso eu adoro o Zeca Baleiro: "Sexo: o melhor da vida é isso e ócio..." Eu não me sinto nem um pouco culpada quando nada tenho a fazer...Mas quanto ao passado e futuro...minha inconstância não me permite ter uma opinião formada sobre isso. Esquecer o passado seria perfeito, no entanto pensar no futuro é pregramar-se. Isso pode ser interessante. A contagem do tempo é irritante, porém necessária, porque a mesma que nos faz loucos cotidianamente nos deixa alegres quando nos dás a oportunidade de recomeçar. Isso acontece uma vez por ano. E ainda há os aniversários...que, pelo menos pra mim, são divinos, datas e mais datas para comemorar e sucumbir-se ao ócio. hehe