quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Quando alguém se aproxima do hedonismo, quase sempre começa achar meio sem sentido o secular culto à carência e ao sofrimento que faz parte da santificação do estado de vítima, bem difundido pela nossa formação cristã ocidental. Diferente do masoquismo clássico, em que a dor é um elemento erótico que conta com um agente sádico para operar um instrumento de satisfação onde todos assumem conscientemente os riscos, a apiedação monoteísta age como cabresto para tentar conter possíveis rebeliões contra um sistema que privilegia muito mais os que tomam (nem sempre à força), que os que cedem passivamente.
No monoteísmo ocidental, a condição agnus dei (vítima sacrificial) é celebrada publicamente como desejável e imagina-se que tal destino por si só, já satisfaça a divindade que o exige. Há nesse pensamento, um nítido induzimento à autopiedade, uma negação culposa dos próprios desejos. Nietzsche foi demonizado quando criticou este tipo de submissão em Assim Falou Zarathustra.
O controverso termo “super-homem”, numa tradução infeliz para “übermensch”, mostrava que a questão ali não era a rebelião humana contra o sobrenatural, mas a adoção sem resistência da fragilidade como o único meio de vida possível, num caminho considerado por ele, contrário ao da natureza. Nietzsche sabia que “übermensch”, não significava uma busca inútil para atingir o estágio mitológico de um ente sobre-humano, significava apenas que talvez houvesse uma escolha melhor que contentar-se em sofrer, lamentar a própria sorte, apegar-se ao medo paralisante da solidão, da angustia de não se ter alguém para injetar "amor" indefinidamente no sem-fundo da carência ou esperando que uma força externa solucione por nós, crises internas por meios mágicos.
Curiosamente, Mario Quintana, que certamente não era um "poetazinho da autoajuda" que vários aprócrifos piegas atribuídos a ele, sugerem na internet, chegou a uma conclusão bem parecida a de Nietzsche em alguns dos poemas da coletânea Apontamentos de História Sobrenatural (1976). A natureza que é muito mais antiga que todas as divindades, tem desde sempre, administrado sem dó essa arena onde pouco imorta viver ou morrer, pois a única coisa que realmente sustenta nossa brevissima existência é a luta.



Em “300”, Leônidas contraria os deuses e assume: "Tonight! We’ll dine in hell".

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