quinta-feira, 18 de março de 2010

Não sabia ao certo quanto tempo, mas certamente eram muitos os meses que eu não dava as caras no Baixo. Razões inquietantes me fizeram trocar a Ataúfo de Paiva pelos arredores da Rua do Lavradio. Certamente devido a esse sumiço, assustei ao ver o Domingos ali na mesa de sempre, mais envelhecido amparado pelo copo de chope, a bengala e um cigarro. Passei por ele, beijei-lhe a testa e selei a Priscilla, depois fui para mesa que o Madureira havia gentilmente guardado. Em menos de dez minutos ela chegou arrastando alguns olhares. Embora tenha somente vinte e quatro, a saia indiana, a camiseta regata com estampas de pena de pavão, o All Star amarelo e a bolsa feita com retalhos de couro pintado, faziam dela o clichê perfeito de algo muito próximo a 1972. Uma das coisas que estranhou em mim foi a ausência de algo alcoólico na minha frente, a outra, foi uma certa calma, quase alienação quanto a algumas questões que tempos atrás, me fariam discursar em cima dum banquinho. Logo após algumas garrafinhas de H2OH e uma pequena porção de provolone, concordamos que o encontro era mesmo para reafirmar o que há de mais valioso numa relação: a amizade. Estavamos ali pelo desejo de matar a saudade da presença sem uma razão especifica e não mais pra sair e transar tórridamente furiosos com antes, nem para fazer nenhum tipo de promessa passional que iria resultar num arrependimento mais tarde. Estávamos era sentindo falta da amizade mesmo. Queríamos quebrar um pouco o peso da solidão de estimação que todos sabemos que mora conosco diariamente, mas de um jeito menos utilitário. Desfrutar do amor à Mário Quintana, num abraço terno, pequenas confissões, perguntas ainda não feitas, alguns beijos molhados, uma pitada de saudosismo e quem sabe, sair de lá seguros de que todas as razões justa ou nem sempre, que inevitavelmente separam os casais mais convictos da eternidade de seus amores, não teria razão alguma em nos afastar além do que a correria do dia-a-dia já faz, justamente por nunca ter havido entre nós, o velho esquema dos romances que acendem iluminando o céu das certezas, um pouco antes de virarem uma borra de carvão feita de memórias a serem deletadas.

5 comentários:

Thaissa Costa disse...

Cara de nostalgia...acertei?

GIL ROSZA disse...

rsrsrs. direi mais... pode até ter sido um dejavú. =)

Camilla Dias Domingues disse...

ah mon chér...
alá Mário Quintana também é bom demais, tipo paulinho da Viola é melhor ainda:

"lembra daquele tempo, quando não existia maldade entre nós.
risos, assuntos de vento, pequenos poemas que foram perdidos momentos depois.
hoje sabemos do sofrimento(...) vivemos estamos vivendo, lutando pra justificar nossas vidas"

Unknown disse...

esta sua citação de um amor a la Mario Quintana me fez lembrar daquele texto dele, Felicidade Realista onde diz:
"A princípio bastaria ter saúde, dinheiro e amor, o que já é um pacote louvável, mas nossos desejos são ainda mais complexos.... E quanto ao amor? Ah, o amor... não basta termos alguém com quem podemos conversar, dividir uma pizza e fazer sexo de vez em quando. Isso é pensar pequeno: queremos AMOR, todinho maiúsculo. Queremos estar visceralmente apaixonados, queremos ser surpreendidos por declarações e presentes inesperados, queremos jantar a luz de velas de segunda a domingo, queremos sexo selvagem e diário, queremos ser felizes assim e não de outro jeito..."
Acho que a busca desta amor irreal que não nos permite ter momentos assim como do texto, de curtir o que há no momento, na amizade, nas coisas simples e básicas da vida, como a Felicidade.

GIL ROSZA disse...

legal o que disse. na verdade, a crônica está em cima duma frase do quintana; "A amizade é um amor que nunca morre." eu creio muito nela, na medida que as amizades que nascem e permanecem amizades galvanizam o amor, já a paixão seguida de romance, quase sempre o oxida.